domingo, 28 de fevereiro de 2010

quinta-feira, 25 de fevereiro de 2010

O sintoma como problema e como solução

Sérgio Laia- EBP-AMP-MG
Por Maria de Lourdes Aragão


Por ocasião da vinda do colega Sergio Laia, da Seção Minas Gerais, ao nosso estado, para participar de bancas de mestrado na UFPB, a delegação Paraíba, fez um convite para que ele pudesse contribuir com os nossos Seminários Preparatórios do VII Colóquio da EBP – “Felicidade: uma política do sintoma?”, onde o mesmo nos apresentou uma brilhante conferência intitulada O Sintoma como Problema e como Solução. A conferência, aberta ao público, foi realizada no auditório do Centro de Ciências Humanas, Letras e Artes da universidade.

Traçando um caminho de Freud a Lacan, Sérgio Laia inicia sua fala, dizendo que na conferência A terapia analítica, Freud diz que um neurótico é incapaz de aproveitar a vida porque sua libido não é dirigida a nenhum objeto real e de ser eficiente porque precisa dispensar uma quantidade valiosa de energia para manter sua energia reprimida.
Nesse sentido, diz Sergio Laia, Freud nos lega o sintoma como uma satisfação inconsciente, e por ser uma satisfação torna-se difícil do neurótico se livrar dela, já que ela torna-se uma forma do neurótico solucionar um conflito.
Em outras palavras: a solução freudiana do problema-sintoma, a solução para a solução problemática que um sintoma acaba sendo para um sujeito é que esse sujeito possa se transformar, com o tratamento analítico, em um “senhor do sintoma”.

Em Lacan, Sergio destaca o que este diz sobre “identificação ao sintoma”, que não se trata de uma “identificação ao inconsciente”. Essa expressão nomeia muito bem o que Freud almejava quando concebia o tratamento analítico como um traço no qual o neurótico deveria se fazer senhor de seu sintoma. Apropriar-se de seu sintoma seria equivalente a se identificar ao inconsciente.
Sérgio Laia enfatizou que, identificar-se a seu sintoma implica colocar-se mais longe do inconsciente, estar mais além do inconsciente.
Nessa perspectiva, nos disse que, se no final de análise temos uma identificação do analisante ao seu sintoma, é porque o sintoma é aquilo que se conhece melhor, é o parceiro do sujeito em sua loida com o real impossível de suportar.
Dessa maneira a experiência de uma análise, afirma Sergio Laia, é a depuração do sintoma como parceiro do sujeito. Se Lacan nos fala acrescenta Sérgio Laia, de um savoir y faire no final de análise, não se trata de um fazer técnico, de um “saber fazer com”. Trata-se, sobretudo, segundo Xavier Esqué, de saber se desenrolar do rolo, tendo o sintoma à mão, como se fosse uma ferramenta. É uma depuração com a redução dos objetos a. É o sujeito demonstrar no que concerne ao gozo de sua vida, uma identificação a seu sintoma sem transformar-se em seu senhor e sem permanecer como seu escravo.
Além da conferência Sérgio Laia participou conosco do Seminário de Estudos Clínicos, atividade interna da Delegação onde contribuiu com um excelente trabalho clínico, trazendo aportes riquíssimos para todos os que praticam a psicanálise de orientação lacaniana.

quinta-feira, 4 de fevereiro de 2010

Felicidade: uma política do sintoma?

Zaeth Aguiar do Nascimento – Correspondente da Delegação Paraíba da EBP

O SINTOMA E A CIVILIZAÇÃO

A articulação em torno do tema sintoma e civilização tomou como referência para dialogar, O Mal-estar na Civilização (Freud, 1930) e “A Sociedade do Sintoma” (Laurent, 2007).
O momento atual da civilização circunscrito com o termo contemporaneidade tem sido conceituado como um tempo de desencanto, mas ao mesmo tempo de promessas: na política, nos ideais, na ciência com suas promessas de felicidade e de garantia de jovialidade. Um tempo em que nos deparamos com o surgimento de novos sintomas que trazem desafios para a prática analítica: a violência desmedida, a toxicomania, a bulimia, a anorexia, a depressão, o empuxo ao consumo desenfreado, as psicoses não desencadeadas, etc.
Diante deste quadro nos questionamos em que lugar deve o analista se situar com seu ato diante dos novos sintomas e qual deve ser a ação analítica no mundo atual?
Em 1930 Freud nos brinda com suas reflexões no seu brilhante artigo O Mal-Estar na Civilização. Neste artigo ele enumera as três medidas que o homem elege para tentar suportar o desamparo diante da vida: 1) derivativos poderosos (e neste cita como exemplo a atividade científica); 2) as satisfações substitutivas (que reduzem ou amenizam o sofrimento – estas são ofertadas pela arte e 3) as substâncias tóxicas (que nos tornam insensíveis ao sofrimento ).
De acordo com Freud, o homem localiza a fonte deste desamparo ou sofrimento que o ameaça em três direções: 1) Na fragilidade do nosso corpo (“condenado à decadência e à dissolução” (p. 95). Neste sentido, constatamos que o homem contemporâneo busca garantias apoiado na ciência, através de diversos recursos para se contrapor a este inevitável; o que podemos chamar de a ditadura da beleza: botox, plásticas, etc; (p.107); 2) No mundo externo, ou seja, no poder da natureza e 3) Na relação com o outro (fonte social) – Freud destaca que esta terceira direção é a que o sofrimento é mais penoso.
Freud ao se interrogar por que é tão difícil o homem ser feliz, aponta que ao ser questionado a respeito de qual o propósito da vida, o homem indica como projeto a busca da felicidade e que esta se concretiza através de duas metas: uma na qual se busca a felicidade pela via da ausência de sofrimento e de desprazer, e outra (negativa) que se dá pela via da experiência de prazer intenso, pela satisfação pulsional sem renúncia.
O método que o homem elege para evitar o sofrimento considerado como o mais grosseiro embora o mais eficaz é a intoxicação o que Freud denomina de “amortecedor de preocupações” (p. 97).
O que Freud denomina de “mal-estar” na civilização ou o que Lacan indica como “sinthoma” na civilização, Miller estabelece sob a forma do matema a > I para definir a conjuntura atual da civilização que tem como predomínio a “ascensão ao Zênite social” (Lacan) do objeto a. Ainda com relação ao momento contemporâneo Lacan aponta o discurso capitalista como um efeito particular do discurso do mestre contemporâneo (Laurent, 2007). É este discurso que produz o objeto a.
A partir de Freud com sua 2ª teoria pulsional, e com Lacan com a proposição do conceito de gozo, podemos localizar no sujeito desta civilização um imperativo do gozo. Laurent localiza no termo overdose da qual o sujeito faz uso para ir de encontro à morte, termo este que não se restringe apenas ao campo das toxicomanias como conhecíamos o seu uso, mas se estende a outros campos: ao excesso de trabalho (advindo a expressão matar-se de trabalhar – o que conhecemos como os Workhaolics), a busca por esportes/radicais perigosos, o apetite pelo risco, o suicídio político (o homem-bomba), o gozar com sua morte, etc.
Laurent aponta-nos as características da subjetividade contemporânea e nesta “percebe-se claramente que o declínio do ideal se acompanha das exigências do gozo”. Permeando a subjetividade contemporânea apresentam-se o hedonismo de massa e o fetichismo da mercadoria generalizada.
Neste sentido, constatamos que o hedonismo de massa que caracteriza o momento atual da civilização é responsável pelo desaparecimento da particularidade do sintoma. A visão hedonista do mundo remete ao acesso ao gozo “para todos”. Laurent acrescenta os dois tipos de relação com o gozo: querer mais gozo e querer a particularidade do sintoma e indica-nos um outro aspecto da experiência de gozo que se diferencia da overdose, que é a experiência do todo e que seria a alloverdose implicando um gozo ilimitado, o todo. Se contrapondo a esta versão do gozo, “respondem os pequenos furos particulares de cada sujeito liberado da tirania de gozar de “tudo” (p. 173)”. Miller (Curso de Orientação Lacaniana, curso 20; ano 2003-2004 – inédito) indica-nos a que ponto a tirania do objeto a na atual civilização é uma tirania que não tem mais laço com a singularidade de cada sujeito, por isto se chama de tirania.
Diante deste quadro da civilização, voltamos a nos questionar qual a ação do analista? Laurent indica-nos que o analista “não pode pretender aliviar o sujeito contemporâneo de sua culpa em relação ao ideal”, pois o sujeito contemporâneo já está aliviado (ele é um sujeito light) e que “o importante não é o aparente alívio do sujeito, mas o peso de sua relação com o gozo” (p. 171). Neste sentido, cabe ao analista, no que diz respeito ao gozo, “reenviar o sujeito à sua particularidade” (p. 172) que diz respeito ao sintoma. O programa de ação do analista na civilização atual é fazer acreditar no sintoma que remete ao singular.
Outra ação do analista na civilização do lugar da psicanálise hoje, diz respeito ao que Laurent denomina de “analista-cidadão”. Desta forma, resta ao analista praticar a psicanálise na cidade, sair da posição de analista intelectual, “Há que se passar do analista reservado, (..) a um analista que participa, (...) sensível às formas de segregação, a um analista capaz de entender qual foi sua função e qual lhe corresponde agora” (Laurent, 2007, p. 143).