quinta-feira, 15 de abril de 2010

A violência urbana e as transformações familiares contemporâneas

Conferência pública de Sérgio Laia na Biblioteca Pública Piloto
Biblioteca da NEL-Medellín


A família também se faz
Entrevista da jornalista Mónica Quintero Restrepo a Sérgio Laia para o diário El Colombiano | Medellín | Publicado em 18 de fevereiro de 2010

A família também é permeada pelo tempo. Não é o mesmo, uma de 50 anos e uma de 20 ou uma atual.
Pode-se recordar a maneira, por exemplo, que muitos dos que hoje são adultos se queixam, em uma brincadeira muito séria, que quando eram crianças, a carne maior era para o pai e agora que são grandes, é para os pequenos. Uma mudança de importância ou de foco, para nomeá-lo de alguma forma.
A família sofreu transformações através do tempo, segundo o momento em que se vive. O que, sim, é claro, e talvez este não muda, é que é uma estrutura fundamental da sociedade.
É possível que o homem já não seja essa figura que dá as ordens e carrega toda a responsabilidade e que agora a mulher seja mais ativa. A construção da família é produto de seu trabalho em conjunto.
Agora, pode-se trazer um conceito de que fala o psicanalista brasileiro Sérgio Laia: "Vivemos em um momento paradoxal, o que faz com que o fato de serem pais não se reduza a procriar. Pode-se ser pai ou mãe não apenas biologicamente".
Assim, não é uma questão de por um óvulo ou um espermatozoide para ter um filho, mas tudo o que há mais além, que tem a ver com a criança, com o ensino, com o que significa realmente ser pais. Isso de compromisso, inclusive.
Desta maneira, disse Laia, quem esteve em Medellín conversando sobre a violência urbana e as transformações familiares contemporâneas, "que nem tudo se resolve biologicamente. Fazer uma prova de DNA para saber se alguém é o pai não é a solução porque este, da mesma forma, pode não aceitar o filho".
É preciso entender, então, e gravá-lo bem na cabeça, que o compromisso de ser pais é gigante e vai mais além de 'fazer' as crianças. E se o ideal é o compromisso dos biológicos, acrescenta Sérgio, "estamos em um tempo de construção no natural. Também é simbólico".

O que se aprende em casa
A família é o lugar onde se transmite, define o especialista, "uma condição subjetiva e não necessariamente tem que construir-se de forma conservadora. É um lugar onde se transmite algo" que é fundamental para o resto da vida.
É mais, faz finca-pé o especialista, há grupos que tem laços de amizade ou de parceria tão fortes que cumprem a função da família. "Coisas que não estão previstas e que não devem ser depreciadas".
O fato é que, disse ele, não é algo bom nem mau em si mesmo. Trata-se de adaptar-se a determinadas condições, se assim o exige o ambiente, para que não afete as pessoas ou o meio.
"Isso é bom desde que se acompanhe com a palavra", acrescenta Sérgio, e dá o seguinte exemplo que aconteceu no Brasil, onde ele realiza investigação e trabalho de recuperação social: Um jovem estava em uma quadrilha de tráfico, na qual pôde haver chegado a exemplo de seu pai, que também fez parte desta, desde quando ele era pequeno.
Recorda o jovem, que sua mãe lhe dizia que as condições em que viviam eram por culpa da decisão de seu pai, de envolver-se em um trabalho ilícito. Assim, o jovem, quando começou seu trabalho de recuperação, não pensou tanto em que devia sair porque era negativo para sua vida, mas porque "queria ser um pai diferente do que foi o seu. Essa palavra lhe permitiu sair", conta Laia.
Dentro da família, formam-se estruturas sociais, inclusive para evitar a violência em geral, e uma específica, como é a urbana.
"Quando vamos educar uma criança, lhe ensinamos a viver. Se um pequeno maltrata um animal, os pais devem dizer-lhe que não e ensinar-lhe porque não se deve fazer". A isto é preciso acrescentar que, se seu ambiente é de maltrato e, portanto, não sabem o que é não serem maltratados, a essas pessoas, grandes ou pequenas, enquanto aplica também para a sociedade, "é preciso dar-lhes melhores condições e oferecer-lhes algo que lhes possa ajudar. Não é apenas uma questão de dinheiro ou educação".
A família é a base para fazer uma sociedade melhor e isso sim, é preferível aprender desde pequenos, com o exemplo e a guia que se encontra nela. E seguindo o especialista, o importante é a família que se tem e que se fez, seja biológica ou não.

Uma proposta integral para a violência urbana
O expert brasileiro Sérgio Laia compartilhou sua experiência de trabalho com a Violência urbana. "É mais localizada e nos faz sentir que estamos aparentemente muito tranquilos, mas com uma atmosfera de angústia". Assinala que se faz anonimamente e tem um viés generalizado de sem sentido, o que não implica deixar de analisar o que está acontecendo e por que, para buscar soluções, sendo conscientes que "o ideal não existe e nem tudo se pode solucionar". O trabalho deve incluir uma união, disse ele, entre psicanálise, cultura, arte e opções de vida.

Comentários dos leitores:
"Se nas famílias de agora fossem levados em conta alguns desses parâmetros, a violência seria menos dentro das famílias e na cidade."

"Excelente, ressalto duas frases do autor para refletir.. A definição de família como uma condição subjetiva... onde se transmite algo"... e "é preciso dar-lhes melhores condições.....Não é apenas uma questão de dinheiro ou educação"...."

Tradução: Mª Cristina Maia Fernandes

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