terça-feira, 1 de junho de 2010

Loucura ou Perversão?

Claudia Figaro-Garcia, Correspondente da EBP-SP

Biagi-Chai, ao relatar a história de Henri-Desirée Landru, que assassinou dez mulheres e um jovem e incinerou seus corpos em uma fornalha de sua casa de campo, na França, no final do século XIX, provoca uma discussão: seria essa uma psicose ou uma perversão? De acordo com o livro, Landru não sabia qual era seu lugar na família, e este teria sido o gatilho para o desencadeamento dos atos criminosos. Biagi-Chai comenta que em sua megalomania havia separação entre ação e ambição. Tem-se início a sua máscara social. Sempre foi visto como responsável e bom pai. Mas é justamente a confusão que Landru faz entre o que é ser Patriarca e não Pai que inicia os sintomas, os quais caracterizam mais uma psicose do que uma perversão. Ao se colocar como Patriarca, posiciona-se como alguém que não vacila, que não apresenta furos ou imperfeições — assim, com a função paterna excedida, o sujeito se torna ele próprio a lei. A concepção delirante de família produz uma missão psicótica — sustento da família — de extrema responsabilidade, cuja lógica conduzirá Landru ao ato criminoso. A megalomania aumenta, assim como a indiferença pelo a’.

Para a autora, a família é como um trabalho para Landru, um significante privado de sua função de ideal, privado de realidade. Família define um dever, um dever com significação privada. A lei pessoal de Dever é seu delírio. Apresentava-se como “comerciante de móveis”, para viúvas, solteiras, mulheres sem família e com dote. Na opinião de Lacan, no filme Monsieur Verdoux, estrelado por Charles Chaplin em 1947, e que se baseou na história de Landru, o personagem selecionava as vítimas. Sua esposa e a amante Fernande pertenciam ao grupo vital. Esta, única a não ser assassinada por ele, além de não querer um marido provedor, mantinha uma relação muito forte com a mãe. As mulheres assassinadas integravam o grupo funcional, as mulheres de que necessitava. O dinheiro que estas deixaram garantirá o sustento da família de Landru.

A mãe de Landru parecia seu único ponto de apoio, estabelecendo-se assim a matriz da identificação imaginária de sua psicose: mãe sem falhas, como a amante. No julgamento, Landru nega tudo e seu discurso frio não demonstrava arrependimento. Foi avaliado por psiquiatras que não diagnosticaram psicose, atribuindo-lhe responsabilidade pelos crimes. Todavia, a certeza delirante, a necessidade de não ter falhas levaram Landru ao ato criminoso. Para a autora, ele avança em um Real sem véu, encarnando a lei. Seus significantes mestres não se articulavam a um saber, não passavam pelo desejo. Respondiam a um postulado delirante: sustentar a família. Na perversão, os criminosos sexuais gozam com o sofrimento do outro, pois driblam o Nome-do-Pai. O que impera é a Lei pessoal. Talvez isso, ter uma lei pessoal, seja algo que aproxime a psicose e a perversão, provocando uma confusão que dificulta um diagnóstico diferencial.



XVIII Encontro Brasileiro do Campo Freudiano
O sintoma na clínica do delírio generalizado

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