domingo, 5 de abril de 2009

Sobre Educação

Carlange de Castro
Psicanalista,Especialista em Psicologia Clinica,Correspondente da EBP, Diretora do CEPP

A educação adquire o relevo de sua época, mudando conforme o tempo. No mundo globalizado, a educação ainda tateia seu lugar. Muito diferente dos modelos tradicionais, na situação moderna, como argumenta Forbes, o que ocorre é que saímos de uma sociedade vertical, hierárquica, para uma sociedade horizontal, em que a lei está em baixa, e tentar retomá-la é antiquado, “traumatiza”, e isso se apresenta com clareza na educação. A estrutura familiar atual mostra-se com uma nova configuração em que há uma queda do referencial masculino e da figura paterna. Com relação à educação de crianças e adolescentes, tornou-se banal presenciar filhos determinando e comandando a dinâmica familiar. Alunos ameaçando professores, diretores, comportamentos que fogem ao chamado bom senso, mas que se configuram como lugar comum. Pais que detestam dizer “não”, abdicando da razão em defesa do filho, transmitindo que tudo se explica, na compreensão ilimitada, reforçando um comportamento irresponsável na ascensão da vida adulta.

Freud postulou o antigo poder patriarcal, mas é Lacan que coloca o pai no contexto de função, sendo uma figura essencialmente simbólica que separaria a criança da mãe, instaurando a lei que corta os laços incestuosos que a une aos filhos. A criança, pela própria dependência infantil, faz Uno com a mãe. Essa relação apresenta-se para a mãe e filho como algo estritamente prazeroso, mas, para que o desenvolvimento desse filho possa ocorrer sem prejuízo, se faz necessária a separação, que é bastante difícil para a mãe. Somente o limite imposto pela função paterna à voracidade materna retira a criança da dependência da mãe, possibilitando ao filho uma realidade ordenada por obrigações e proibições. Ora, é através desse dispositivo que a criança vai assimilar os registros sociais e poder entrar no circuito educacional, pois educação não é sinônimo de escola ou pedagogia, mas refere-se ao meio social em que o sujeito está inserido e a forma como ele se articula a esse meio. É através da função paterna que a criança entra nos padrões das leis, articulando desejo e lei, fatores que a sociedade tende a manter como disjuntas. Ser pai é essencialmente ser responsável.

A flexibilidade encontrada na educação, bem como, no mundo moderno, reforçam um imaginário que tudo pode apontando ao um real de excesso, que apresenta como contraponto o mal-estar cotidiano gerando angústia e sintomas, situação recorrente que busca concordância nos remédios, psicoterapias e escolas.

Por associar educação e escola, muitas famílias têm deslocado essa função para uma instituição que não pode exercer a árdua tarefa de educar, já que a doutrina pedagógica articula educação à aprendizagem, postulando um saber completo que busca desenfreadamente respostas, numa direção que aponta no sentido do não saber fazer. Pensar no processo educativo é articulá-lo ao plano da subjetividade, e a psicanálise avança nesse sentido quando coloca a questão da verdade do sujeito, perguntando pelo seu desejo que a própria educação recusa insistindo em apontar a questão do sujeito da verdade.

Educar é educar as pulsões, logo observamos que tal tarefa não tem garantias, já que no inconsciente algo sempre escapa impossibilitando o seu alcance, nos deixando enquanto resto a linguagem e a tentativa de comunicação, pois a mesma é atravessada o tempo todo pelo mal-entendido, por aquilo que não faz sentido. Assim, seu desafio maior é suportar o risco que é da ordem do não explicável dentro de um processo que anseia explicação para tudo.

Referências Bibliográficas:
Freud Sigmund, Obras psicológicas completas, vol: VII, edição Standard, Rio de Janeiro: Imago, 1996
Freud Sigmund, Obras psicológicas completas, vol: XXII, edição Standard, Rio de Janeiro: Imago, 1996
Jorge Forbes: Silêncio das Gerações
http://www.jorgeforbes.com.br/br/contents.asp?s=23&i=74
Mezan, Renato: Freud, Pensador da Cultura

2 comentários:

CRONICAS EM CAPS LOCK disse...

"Educar é educar as pulsões" PERFEITO!!! vejo os problemas da sociedade ratificados aqui, de uma maneira crítica, nao obstante, vejo sim, uma perspectiva de tal situação mudar...

pois " se pensamos, logo existimos"

by pintordalua (diego-iesm)

Adriano Lobão Aragão disse...

Um ótimo texto. parabéns!